segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

A nossa teimosia...

Trocamos de meias, cuecas, calças, camisas, carro e até de companheira/o. Para tal, basta que nos comprometam ou traiam… de clube ou partido é que não!

Todavia, se percebo a razão relativamente ao clube, o mesmo já não acontece com o partido.

Dum modo geral, todos nós temos um clube da nossa simpatia. No meu caso pessoal, talvez por influência doméstica e paternal, mas não por imposição, ao longo da minha infância e adolescência habituei-me a conviver com aquele clube, decorrendo essa simpatia até aos dias de hoje. Digamos que é uma espécie de apêndice familiar. Se ganham, a alegria irradia casa dentro e tudo é fantástico e fabuloso. Se perdem, bom, aí, não há nenhum drama mas, convenhamos, a atmosfera é outra, os semblantes mudam um tudo-nada para o carregado…porém, quando tal acontece, a não ser aquela tal “azia”, não vem mal nenhum para a minha saúde, educação ou harmonia familiar…

No caso dos partidos há uma ligeira diferença, dum modo geral e tendo em consideração a grande abstenção nas urnas, nem todos nós temos um partido da nossa simpatia. No meu caso pessoal, não sou, nem nunca fui militante de qualquer partido. Porém, não por influência partidária, mas sim por simpatia e respeito por aqueles homens e mulheres abnegados e lutadores que no passado tudo fizeram (alguns até a vida deram) em prol da liberdade, da democracia e do bem-estar da população. Homens e mulheres que hoje continuam com a mesma coerência e dedicação e sem qualquer outro interesse que não sejam os valores já referidos. Por tudo isto (que não é pouco), tem havido sempre interesse e justificação para votar num partido. Todavia, não havendo no quadro nacional, partidos cujo programa eleitoral não venham ao encontro daqueles valores, não me absterei de votar. Voto em branco. O voto em branco é tão válido como os outros, só que tem esta pequena (grande) diferença: não vota em ninguém, ao contrário da abstenção que vota na maioria! Quem cala consente…já repararam que mais de 3 milhões de portugueses não votam. Por isso é que o partido do governo se sente legitimado e mandatado pela maioria absoluta (que, de facto, não tem). E mais, Salvo melhor opinião, apesar da liberdade nos dar o direito de não votar, eu considero que não votar é uma ofensa àqueles que lutaram e sofreram para nós termos esse direito!

Vamos no 18º Governo eleito por sufrágio livre e universal. Como não foi sempre o mesmo partido a governar, Será que podemos afirmar que a maioria nunca trocou de partido? Ora bem, Indo ao cerne da questão, acho que podemos afirmar que a maioria nunca trocou de partido. O que tem contribuído para a alternância governamental, é uma franja do eleitorado que anda ao sabor das promessas, ora vota num, ora vota noutro partido, não percebendo que no papel esses partidos são diametralmente opostos, mas na prática (e esta é que conta) são iguaizinhos!

O engraçado é ouvir-se nalgumas conversas, nos transportes públicos por exemplo, frases como: “eu não votei neles!”, “eu não voto!” ou “eu nunca mais voto neles!”. E quando se pergunta porque é que não troca de partido. A resposta é invariavelmente esta: “trocar para quê? São todos iguais!”, ou então: “Ah, sempre votei neles, não é agora que vou trocar!”.


Ao contrário dos clubes, no caso dos partidos (os dois governamentais), não é a mesma coisa. Sempre que há maus resultados (e tem havido muitos), não é só “azia” que sentimos, é sobretudo o nosso futuro que tem sido, e é posto permanentemente em causa. Não podemos encarar os partidos como encaramos os clubes. Não podemos encarar o 1º Ministro como encaramos o treinador ou presidente do nosso clube. Se o treinador do nosso clube tem uma má táctica, o que é pode acontecer? Perder 3 pontos? Uma taça? Um campeonato? E depois? O que é que isso tem de mal para o nosso futuro?...

Moral da história: podemos viver uma vida “agarrados” a um clube sem necessidade de trocá-lo face aos seus maus resultados. Já vimos que a única consequência, dos tais maus resultados, é a tal “azia”, nada que não passe ao fim de algumas horas, ou dias nalguns casos!...

No caso político, não podemos viver “agarrados” a um partido. Sempre que houver mudanças de Direcção, há que estar atentos e vigilantes com o rumo dado ao partido. Nos partidos governamentais, o que tem acontecido, é que sem mudarem o nome do partido, as mudanças estratégicas, por vezes, vão de extremo a extremo…

Naturalmente, não podemos, nem devemos, subestimar todas as alterações que se verificaram no pós 25 de Abril até à actualidade. Mas com isso não podemos vedar os olhos ao ponto de negarmos a realidade actual. Que nalguns casos está pior que antes do 25 de Abril…veja-se o caso do Regime laboral, por exemplo.

Vai ser o eterno problema deste país, contra mim falo, acomodámo-nos…e nem trocamos de partido, e muito menos fazemos algo para trocar o interior dos partidos, ou criarmos outros partidos!!!

Um Abraço.

Orlando Duarte

sábado, 29 de novembro de 2008

Sábado - o dia dela

Tinham-lhe dito que o sábado era dela. Caíra-lhe em sorte num escalamento rigoroso de turno fabril em que as máquinas não podem parar, sucedendo-se e variando apenas os dedos que as manuseiam, garantindo uma produção contínua e lucrativa à custa do suor e do sangue dos operários que para não lhes faltar o pão, não faltam ao lugar que lhes foi atribuído, sob pena de se o fizerem, amanhã estarem na rua sem pão.

Apesar disso, ela tem faltado no dia e à tarefa que a si compete. Não se tem deixado muito ver. Tem-se escondido e o seu lugar à mesa do chá tem-se mantido vazio, com uma chávena de chá já frio e sem graça. Não fossem os amigos da mesa que se têm mantido firmes e outros em mesas vizinhas, talvez ela não voltasse mais...
…………..

Quando a cerca de uma semana de comemorar o seu 36º aniversário a encontraram no leito, de

“…olhos serenos, enigmáticos

Meninos que na estrada andam perdidos,

Dolorosos, tristíssimos, extáticos,

…/… letras de poemas nunca lidos”(*),

os dois frascos de Veronal estão ainda praticamente cheios, e lê-se a terminar o seu “Diário do Último Ano:

” … e não haver gestos novos nem palavras novas.”

E não houve. Nem gestos nem palavras. Dela. Não chegou sequer a completar os seus 36 anos…

(*) – Florbela Espanca, extracto de “A Mensageira das Violetas”

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

I HAVE A DREAM

Hoje é um dia particularmente importante para mim. As comemorações valem o que valem, é verdade. Mas tenho bons motivos para estar feliz e orgulhoso porque o meu blogue Orientovar [www.orientovar.blogspot.com] faz um ano de vida.

Quis partilhar esta efeméride aqui também, deixando o convite a que passem por lá. É que eu tenho um sonho e só lá é que o desvendam!

JOAQUIM MARGARIDO
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domingo, 23 de novembro de 2008

OBESIDADE...


Não querendo entrar por pormenores mais complexos e exaustivos, ainda assim, para ilustrar a minha tese, deixo-vos esta ideia:

Em grande parte do Continente Africano, a generalidade das pessoas deslocam-se a pé; e por via da fraca industrialização, as actividades profissionais são muito braçais e de pulso; a alimentação escasseia e, não sendo nutricionalmente pobre, é algo deficiente.

Do lado oposto está a América do Norte, onde as deslocações fazem-se maioritariamente de carro, a tecnologia industrial está altamente desenvolvida, retirando ao ser humano, os incómodos mas úteis, esforços físicos; a alimentação abunda, mas na sua generalidade é altamente má nutricionalmente.

Resumindo e concluindo: na África não há altos índices, quer glicéricos, quer colesteróis, e muito menos de obesidade. Por outro lado, é na América do Norte que existem os mais altos índices de glicemia, colesterol e sobretudo de obesidade. Ou seja, analisando mais a frio: as doenças que matam em África, não matam na América do Norte, e vice-versa!

Nem oito, nem oitenta…como tudo na vida, no meio é que está a virtude! Por cá, neste rectângulo à beira-mar plantado e inseridos no mediterrâneo, temos um pouco de tudo o que acontece nas referidas regiões, basta analisar o país do interior para o litoral.

Todavia, temos o privilégio de usufruir duma gastronomia mediterrânica, como é sabido, altamente nutritiva e equilibrada; temos um clima temperado, a pouco e pouco vai aparecendo infra-estruturas desportivas, temos vindo a crescer culturalmente e, hoje, já se encara as várias actividades desportivas naturalmente.

Contudo, infelizmente, e também a pouco e pouco, não temos sabido manter este equilíbrio e cultura. Não sei se fruto da carência e privação por que passaram, a geração dos anos 50/60 deixou-se seduzir pelas “novidades” vindas da terra do Tio Sam, quer a nível gastronómico, quer electrónico. Com a agravante de não sabermos cativar a juventude para a nossa (Mediterrânea) alimentação saudável e para as actividades desportivas, de facto, e não virtuais como acontece actualmente!

Naturalmente, estas atitudes só podiam dar um resultado – altamente preocupante: a subida avassaladora dos índices de OBESIDADE NAS CRIANÇAS DESTE PAÍS!!!

Um Abraço

Orlando Duarte

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Saúde Para Todos



Na sala de espera do centro de saúde, o ambiente era "sem graça". Quem ali estava, sentia-se com pouca vontade de falar ou então não se encontrava outro assunto a não ser os males que apoquentavam cada um. À parte isso, de um lado tossiam, do outro espirravam e o “remédio” era ... esperar pela vez de ser atendido.

Neste cenário cinzento, ninguém esperaria ouvir uma gargalhada em uníssono, dos presentes, mas aconteceu, porque, apesar de tudo, há quem consiga brincar com a sua debilitada condição:

O Ti Domingos da Ribeira saía, vagarosamente, do gabinete médico, coxeando, apoiando-se na sua bengala à direita e segurando um saco cheio de radiografias com a mão esquerda. Movia-se com dificuldade. Fez uma paragem e, em poucas palavras, fez um resumo do que a médica lhe dissera, para que todos ouvissem :

-Diz qu’ ê ‘ tou bom !!! Eu acho que não, mas ela “é que sabe”!

Fernando Andrade

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

LUZ E SOMBRAS


Empenhadamente, ou apenas para matar o tempo, lemos um jornal, ouvimos um programa de rádio, sorvemos um livro, escutamos uma música. Mais tarde ou mais cedo acabamos por esbarrar em algo que nos faz pensar com os nossos botões: “Ora aqui está uma coisa que eu gostaria de ter dito”. A expressão ou a simples ideia fica a bailar-nos no espírito, apropriamo-nos dela como se fosse nossa, aplicamo-la naquilo que de importante fazemos ou dizemos. E procuramos transmiti-la, tal como irei fazer, aqui e agora.

“A humanidade parece uma lebre encadeada pelo farol dum automóvel apocalíptico. De um lado, sombra; do outro lado, sombra; e no meio da estrada, inexorável, o mortal foco de luz. Nada que guie, esclareça, ilumine. Apenas um clarão paralisador, que só dura até que as rodas esmaguem a razão deslumbrada.”

Foi isto escrito em Palheiros de Mira, no dia 27 de Setembro de 1948. O seu autor: Miguel Torga [in, “Diários”]. Para ler, reler, treler e… meditar!

JOAQUIM MARGARIDO

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terça-feira, 18 de novembro de 2008

A SAUDADE…


Todas as pessoas que passaram na minha vida deixaram a sua marca.

As que permanecem…é porque houve algo que fez que ficássemos em sintonia.

As que partiram…deixaram alguma lições. Não importa que tipo de atitude tiveram, mas com elas aprendi muito.

Com as vaidosas e orgulhosas

Aprendi que devo ser humilde.

Com as carinhosas e atenciosas

Aprendi a ter gratidão.

Com as duras de coração

Aprendi a dar o perdão.

Com as pessoas que passaram na minha vida, aprendi também a amar de várias formas.

Com amizade,

Com dedicação,

Com carinho,

Com atenção,

Com atracção,

Com paixão ou com desejo.

Mas nunca ninguém me ensinou e nunca aprenderei como reagir perante a saudade… que algumas pessoas deixaram em mim.

A saudade é a luz viva que ilumina a estrada do passado. (Anónimo)

Um Abraço

Orlando Duarte

domingo, 16 de novembro de 2008

A MINHA PASSAGEM (fugaz) PELA ORIENTAÇÃO…


















Tudo começou em 19 de Maio de 2007, em Montachique, no 13º Troféu de Orientação do CPOC. E não podia ser da pior maneira…com um famigerado mp! Da pior maneira tecnicamente, porque em termos de introdução à matéria não podia ser melhor! Bom mapa, bom apoio aos iniciados, excelente local que é aquele Parque Municipal de Montachique! Aliás, é a mais-valia da orientação face ao atletismo, por exemplo, que é levar-nos: 1º à natureza, 2º a locais paradisíacos que de outra forma dificilmente lá iríamos.
Resumindo e concluindo: tinha elegido esta prova como teste, e o resultado foi, aprovado!

E assim, tomei a decisão de participar em alguma provas, intercalando-as, sempre que possível, no calendário das corridas. De seguida, comecei a pesquisar na net, sítios com instruções e informações sobre sinalética, melhores opções, etc. etc.. Participei em acções de formação, inscrevi-me, por duas vezes sem êxito, em cursos de cartografia do INATEL, dialoguei com atletas mais experientes, enfim, fiz tudo que estava ao meu alcance para melhorar o meu desempenho na Orientação.

Nas provas seguintes – 9º G.P. RA 4, OPT1, 3º Clac o´meeting, OPT2, 14º Troféu do CPOC, OPT2, Open de Orientação da Nazaré, OPT2, 19º Troféu AAMafra, OPT1 com amigos, 3ª Jornada de orientação Mexa-se Mais, Oeiras, OPT3, 3º Open ATV, OPT3, 4ª Jornada de orientação Mexa-se Mais, Fábrica da Pólvora, OPT3, NAOM 2008, OPT3, O´PORTO PARK RACE, Serralves, OPT1 com amigos – fui subindo no grau de dificuldade e o resultado foi um misto de boas e más prestações: boas, quando o mapa era menos técnico, e aí imperava a parte física da corrida; más, quando os mapas eram muito técnicos, e aí, nem a minha melhor forma na corrida me salvavam! Havia sempre algo que corria mal, nestas ocasiões, andava um pouco por intuição e atingia os pontos por tentativas (às vezes, muitas).

Ao fim desta dezena de provas, facilmente percebi que sem treinos técnicos dificilmente evoluía. Facilmente entrei no paradoxo do prazer/aborrecimento. Gostava de participar, mas chegava ao fim e reconhecia que andava um pouco “ao calhas”. Pessoalmente gosto muito de marionetas, mas jamais serei uma marioneta. Quando faço algo, ou movimento gosto de saber como e porquê. Andar lá no meio só por andar, não é coisa que me alicie muito…

Facilmente percebi que a Orientação é uma modalidade espectacular, apaixonante e viciante. É uma modalidade que, para além de desenvolver a parte física, desenvolve a parte cognitiva, está permanentemente a pôr-nos à prova sobre a nossa capacidade de decisão. A escolha da melhor opção é um dilema permanente. Dificilmente se faz uma prova perfeita, há sempre um mas, ou um se…


Também percebi que na Orientação, à excepção de dois ou três clubes, a realidade clubista raramente tem uma identidade local. Há um grupo de pessoas de vários locais que se juntam nas provas. Ao contrário das corridas, em que se pode treinar, praticamente, em qualquer local e a qualquer hora, a Orientação exige muito o contacto com a natureza, e isso é mais complicado para o cidadão urbano e trabalhador por conta de outrem.

Também percebi que na Orientação, aliado aos aspectos atrás focados, há uma vertente económica muito forte. Raramente há provas nas redondezas da localidade de residência, e as deslocações impõem-se, e se noutros tempos era mais um aliciante para a modalidade, nos dias de hoje, não obstante a facilidade das dormidas nos pavilhões, são muito onerosas, já para não falar no preço das inscrições das provas…

salvo melhor opinião, por tudo isto se justifica a minha, muito, fugaz participação! Porém, enquanto durou, foi bom, gostei! Se calhar… perdeu-se um orientista, mas um amante da modalidade, NUNCA!!!

Um Abraço e até uma próxima!

Orlando Duarte

sábado, 15 de novembro de 2008

E AS MULHERES?...


Desde a origem do universo que a mulher tem desenvolvido importantes acções, quer na vanguarda, quer na retaguarda junto e no seio familiar. Há histórias interessantíssimas sobre mulheres guerreiras e lutadoras, mulheres piedosas e solidárias, mulheres com altos índices culturais que tudo deram e fizeram em prol da humanidade. Porém, houve sempre quem teimasse em considerar isso em actos isolados e irrelevantes e submetessem a mulher para um 2º ou 3º plano e, pior ainda, as castigassem com proibições e obrigações desumanas.

Para não recuar muito na história de Portugal, porque quanto mais para trás pior, vale a pena lembrar que este país viveu 48 longos anos de obscurantismo (1926/1974 ditadura fascista), onde se desenvolveram várias descriminações, quer raciais, xenófobas, políticas (sobretudo) e de género ou sexo. E é esta última discriminação que eu quero trazer à colação.

Luísa sobe, sobe a calçada, sobe e não pode que vai cansada.
Sobe, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe sobe a calçada.
Saiu de casa de madrugada; regressa a casa é já noite fechada.
Na mão grosseira, de pele queimada, leva a lancheira desengonçada.
Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Luísa é nova, desenxovalhada, tem perna gorda, bem torneada.
Ferve-lhe o sangue de afogueada; saltam-lhe os peitos na caminhada.
Anda, Luísa. Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Passam magalas, rapaziada, palpam-lhe as coxas não dá por nada.
Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Chegou a casa não disse nada. Pegou na filha, deu-lhe a mamada;
bebeu a sopa numa golada; lavou a loiça, varreu a escada;
deu jeito à casa desarranjada; coseu a roupa já remendada;
despiu-se à pressa, desinteressada; caiu na cama de uma assentada;
chegou o homem, viu-a deitada; serviu-se dela, não deu por nada.
Anda, Luísa. Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Na manhã débil, sem alvorada, salta da cama, desembestada;
puxa da filha, dá-lhe a mamada; veste-se à pressa, desengonçada;
anda, ciranda, desaustinada; range o soalho a cada passada,
salta para a rua, corre açodada, galga o passeio, desce o passeio,
desce a calçada, chega à oficina à hora marcada, puxa que puxa,
larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa,
larga que larga, puxa que puxa, larga que larga; toca a sineta
na hora aprazada, corre à cantina, volta à toada, puxa que puxa,
larga que larga, puxa que puxa, larga que larga, puxa que puxa,
larga que larga. Regressa a casa é já noite fechada. Luísa arqueja
pela calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe,
sobe a calçada, sobe que sobe, sobe a calçada, sobe que sobe,
sobe a calçada. Anda, Luísa, Luísa, sobe, sobe que sobe, sobe a calçada.
Poesias Completas (1956-1967) António Gedeão

Naquele tempo a mulher não tinha direitos! Ou por outra, tinha…o direito a estar calada e abaixo de cão! A mulher para sair do país tinha que ter autorização do marido! A mulher não podia ser proprietária de nada sem conhecimento e autorização do marido! A mulher não tinha direito de voto! A prova mais longa que a mulher estava autorizada a participar era…1500 metros!!! A mulher era, aquilo que se diz na gíria: um verbo-de-encher!!!
Felizmente, há trinta e quatro anos, as políticas do país mudaram, as mentalidades (muito) paulatinamente vão mudando e, hoje, já há sinais de clara mudança na nossa sociedade. Há empresas altamente dirigidas por mulheres, mulheres nas chefias militares e de segurança pública, mulheres deputadas (62 = 26.95 % do parlamento), mulheres no governo (2 = 11.76 %) e até na direcção da Federação Portuguesa de Atletismo (2 = 15.38 %)!
E nas corridas?...
Neste caso, o quadro não é muito diferente do acima descrito. Felizmente, o conceito que a mulher é para estar em casa a coser meias…já vai sendo do passado, pelo menos nas grandes metrópoles. Certamente que no interior a coisa ainda vai rareando…
Todavia, a pouco e pouco, a participação tem vindo a aumentar. Dos 4,5,6 % habituais, está-se a verificar em provas com Minis, participações de 15, 20 e 25 %, o que revela estarmos no bom caminho…
Contudo, há que deixar uma palavra de apelo aos organizadores, no sentido de pensarem mais um pouco nas mulheres, apelar aos organizadores para alterarem os regulamentos e alterarem as grelhas de prémios a fim de se irem esbatendo as assimetrias actualmente existentes, quer na qualidade, quantidade e até na distribuição dos escalões etários!
Um Abraço.
Orlando Duarte



sexta-feira, 14 de novembro de 2008

VIDAS...

“Ninguém contava anedotas como ele”, dizem-me os “rapazes” da sua idade, recordando intermináveis tardes de sábado num banco da Praça ou na beira do Cais da Pedra, às tainhas. Todavia, eu nunca vi nele um contador de anedotas, mas antes um contador de histórias. A sua capacidade de improvisação, aliada a uma imaginação transbordante, transformava a anedota mais corriqueira nisso mesmo, uma deliciosa história. Com a inerente graça, é certo, mas sobretudo com inteligência, jogando com as palavras, sem concessões à grosseria ou ao riso fácil.

Falo de alguém que conheço muito bem e com quem tenho privado (literalmente) ao longo de toda a minha existência. Falo do meu pai. Nessa relação de afectos que ultrapassa o normal entendimento das coisas, bebi eu uma grande fatia daquilo que sou hoje. É impossível não me rever nele nos meus gestos e atitudes, na minha postura perante mim e os outros.

Vem isto a propósito duma história que o meu pai me contou um destes dias. Não apenas mais uma, mas uma daquelas que me fez sorrir, pensando no quanto o acaso determina inflexões na nossa vida, as quais acabam por ser determinantes naquilo que fomos, naquilo que somos.

Quando assentou praça em Estremoz, após a recruta, era chegada a altura de determinar as especialidades de cada um. Formados na parada, os soldados iam respondendo às solicitações do Sargento. “ – Quem percebe de carpintaria?”, ou “ – Quem trabalha em padarias?”, ou ainda “ – Quem tem carta de condução?”, e por aí fora. À medida que a Companhia ia sendo “desmembrada”, cogitava o meu pai com os seus botões o que lhe haveria de cair em sorte. As perguntas sucediam-se, até que se ouviu: “ – Quem sabe escrever à máquina?”.

Não sendo escriturário de profissão, a verdade é que o meu pai tinha tirado o Curso de Dactilografia e “dava uns toques”. Porém, estranhamente, permaneceu mudo e quedo, enquanto uma campainha soava no seu cérebro. “ – Ai sabes escrever à máquina? Então vais carregar o piano para o Gabinete do Comandante”, pensou, fazendo fé nas inúmeras histórias mirabolantes que se contavam em torno destas ocasiões. E é aqui que entra o amigo Baeta.

Alto e desengonçado, o Baeta conhecia muito bem as habilitações do meu pai. “ - Macedo? Oh Macedo? Então tu não sabes escrever à máquina?”, disse-lhe, baixinho, no meio da formatura. “ - Cala-te, pá!”, advertiu o meu pai entre dentes. A voz do sargento fez-se ouvir de novo: “ - Quem sabe escrever à máquina?” E o Baeta já irritado: “ – Macedo, não me disseste que tinhas o Curso de Dactilografia?”. Desta vez o meu pai nem respondeu, sentindo os olhos do Sargento cravados nos dele. Fez-se um compasso de espera e o Sargento, desviando o olhar, com um certo desencanto na voz que mais parecia confirmar as convicções do meu pai, repetiu pela última vez: “ – Então não há mesmo ninguém que saiba escrever à máquina?”

O Baeta não resistiu mais. Esticou a sua comprida perna, encostou a bota ao traseiro do meu pai e, com um sacão enérgico, obrigou-o a dar três passos em frente. Agora não havia nada a fazer. Era esperar pelo veredicto. O Sargento saudou com entusiasmo o aparecimento do “candidato”, - “óptimo, óptimo…”, disse - e colocou o meu pai de parte, à sua guarda pessoal.

Final da história: O meu pai cumpriu o resto do serviço militar na Escola Prática de Cavalaria, em Santarém, como… Escriturário! “Éramos os doutores da tropa”, recorda ele com nostalgia e um indesmentível prazer. “E devo isso ao Baeta”, reconhece.

JOAQUIM MARGARIDO

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quinta-feira, 13 de novembro de 2008

MORTE NO PELOTÃO...



Na última Maratona de Nova Iorque houve a notícia de duas mortes (ataques cardíacos). Se considerarmos que estiveram em actividade cerca de 40 000 participantes, e analisando friamente os números, somos tentados a considerar como normal estes acontecimentos. Porém, nem que estivessem em actividade um milhão de pessoas; uma morte que fosse seria sempre uma tragédia. O desporto em geral, e o atletismo em particular, terá que ser encarado como um factor de saúde e não de morte.

Felizmente em Portugal, raramente temos (más) notícias de graves acidentes como o de Nova Iorque. Contudo, este exemplo deve ficar na memória dos atletas de pelotão para que o desporto, nomeadamente a corrida, possa ser feita com total segurança dos seus intervenientes.

Vale a pena recordar, que um dos principais factores de segurança depende directamente do próprio praticante. É ao atleta de pelotão (e não só, mas sobretudo) que tem a obrigação de respeitar uma, pelo menos, das regras fundamentais para quem quer ter uma actividade desportiva regular: o acompanhamento médico.

A prática regular de corrida deve ser um elemento de bem-estar e para o qual não deve conhecer exageros. Correr pelo prazer é que todos, mas sobretudo os veteranos, devem fazer, lembrando-se que correm para ter e prolongar a saúde e não para a desgastar, e muito menos para nos levar à MORTE!


Um Abraço


Orlando Duarte

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Solidariedade...


“A vida passa a correr, corremos por tudo e por nada, porque não fazê-lo por quem não pode?”

Este era mote do projecto "Unir para Sorrir", que o Clube Stress levou a efeito, de 9 a 10 de Setembro 2007, e que pretendia reunir cerca de 30 mil participantes numa corrida de solidariedade entre o Porto e Lisboa.

Infelizmente nessa altura estava lesionado e não pude colaborar, de facto, com essa iniciativa.

Ainda assim, não querendo ser indiferente, desloquei-me a um supermercado e adquiri dois “Kits” para ajudar e integrar o grande movimento nacional de solidariedade na oferta das dez carrinhas adaptadas ao transporte de pessoas com incapacidades.

Apesar de estar atento aos noticiários, Catorze meses decorridos não me consta qual o resultado desta iniciativa. Será que o objectivo (dez carrinhas) foi alcançado? Se não, quantas foram? E que instituições foram premiadas?

Bem sei que o Clube Stress e a sua Direcção, têm levado a cabo outras iniciativas de solidariedade mais ligeiras que esta, e não são pessoas de, por isso, andarem de nariz empinado. Porém, face ao âmbito nacional que esta iniciativa teve, era de bom senso divulgarem amplamente os resultados da mesma, independentemente de terem sido bons ou maus, sob pena de, assim, retirarem crédito a tais iniciativas futuras…

Um Abraço.

Orlando Duarte

domingo, 9 de novembro de 2008

ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE…



Há muitas maneiras de amar. Mas para que uma relação amorosa seja vivida plenamente, têm de coexistir em harmonia três ingredientes mágicos: o desejo (Eros), a amizade (Philia) e a ternura (Ágape). Se os soubermos equilibrar, viveremos o amor de forma completa e apaixonada. Se, pelo contrário, nos inclinarmos demasiado para um deles, viveremos um amor imperfeito. (Walter Riso)

O meu pai foi o quarto filho de dez. A minha mãe foi a terceira de cinco. Eu fui o último de sete. Os meus avós, quer maternos, quer paternos, viveram juntos até que a morte os separou. Os meus pais viveram juntos até que a morte os separou. Eu já estou casado há 31 anos, espero, e desejo, que só a morte nos separe. E mais, desejo não ficar viúvo! Jamais saberia viver… sem a minha companheira e mãe dos meus filhos!

Hoje, tudo isto mudou. Não obstante a educação e a formação virada para o respeito dos mais altos valores da solidariedade, lealdade e fraternidade, que tentámos dar aos nossos filhos, e que, estou certo, conseguimos incutir em ambos, não foi suficiente para que eles seguissem os seus familiares precedentes. Porém, também estou seguro, que mais cedo do que tarde, irão trilhar os caminhos dos Laços de relacionamento profundo, Laços com Amor Ágape, Laços de Compromisso e até que a morte os separe!!!

Hoje tudo é mais descartável. O mundo tornou-se mais egoísta. Fomenta-se cada vez mais o espírito independente. O espírito colectivo e associativo está em vias de extinção. O conceito familiar, de vida e do compromisso, não consta do vocabulário dos jovens. Já não se pondera, pelo menos, os cinco princípios básicos de relacionamento:

1º Conhecimento
2º Confiança
3º Comunhão
4º Compromisso
5º Crescimento

Hoje, ou oito ou oitenta: dum fraco conhecimento (hoje não se namora, anda-se…), parte-se para o crescimento (relacionamentos sexuais precoces com gravidezes aos 14/15 anos). Ou há casamentos com grandes e luxuosas festas como se fossem festas de fim de ano ou de aniversário e que ao fim dum ano, ou menos, cada um vai para o seu lado…

Há quem critique muito esta nova Lei do divórcio. Porém, o português tende a confundir tudo. Independentemente desta Lei estar bem ou mal, o principal e fundamental problema está no tal salto nos cinco princípios básicos de relacionamento.

Hoje, temos casas maiores, porém famílias menores.

Temos mais conhecimentos, porém menos discernimento.

Temos mais remédios, porém menos saúde.

Multiplicamos os nossos bens, porém reduzimos os nossos valores.

Falamos muito, amamos pouco e odiamos demais.

Temos dinheiro, porém menos moral.

É tempo de Liberdade, porém de menos alegrias…

Dias em que chegam dois ordenados a casa, porém de lares desfeitos.

Claro que todos os contratos e acordos são passíveis de se revogarem. Contudo, deve haver, tem que haver, um mínimo de conhecimento, confiança e comunhão para chegarmos ao compromisso e, por fim, ao crescimento com fortes probabilidades de ser eterno e por conseguinte, ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE!!!


Um Abraço.


Orlando Duarte

Gratidão...




Ainda a propósito desta minha participação na 3ª Maratona de Lisboa (1988), quero dizer e realçar o seguinte: Há quem diga que “A trás dum grande homem, há sempre uma grande mulher!” No meu caso, eu digo e afirmo: “ao MEU LADO (no quotidiano) esteve uma GRANDE MULHER!Sem dúvida, a treinar com o afinco e determinação como eu o fiz, sem a ajuda da minha companheira de vida (neste caso de corrida), jamais seria capaz de a terminar, quanto mais realizar a marca (embora modesta) que alcancei!Por último, mas não em último. Gostava de deixar uma palavra de grande apreço pelo Companheiro e Amigo “Naia” (que se vê ao meu lado a correr), que assim que soube da minha vontade em fazer a maratona, se disponibilizou para me acompanhar nos “primeiros” trinta quilómetros. Todavia, face ao meu desânimo com os tempos de passagem e, a dada altura, a manifestação de vontade de desistir, passou os trinta, trinta e cinco, quarenta… e terminou ao meu lado; sempre, sempre, incentivando-me, motivando-me e fazendo crer que o objectivo (menos de 3 horas) era alcançável.
Um Abraço e até à próxima!
Orlando Duarte

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Vinte anos...

Faz hoje vinte anos sobre a minha, única, participação numa prova de maratona. Única, não por não gostar ou temer a distância, mas por questões relacionadas com as articulações ao nível dos joelhos.

Desde que me conheço que sinto dores nos joelhos, especialmente nas flexões e na chamada, posição de cócoras. Por volta dos vinte anos de idade, e numa altura em que as dores do joelho direito eram quase insuportáveis, decidi ir ao ortopedista. Depois duma breve observação sou enviado para o Rx. Duas semanas depois obtenho o veredicto final: Patelas Bipartidas.

Daqui até à sala de operações foi um ápice. Quatro a cinco meses de recuperação e volto às corridas. Paulatinamente, como convinha, vou subindo de forma, aumentando a carga e um ano depois estava a 100 % e pronto para atacar todas as provas, excepto a mítica maratona.

Naquela altura, com três anos de corridas, não me seduzia muito a ideia de andar horas e horas a correr. Porém, com decorrer dos anos, com o aumento da resistência física e mental, com o aumento dos conhecimentos da matéria, o bichinho da maratona começou a roer cá na cabeça e pensei: “com mais ou menos dores, tenho que fazer uma maratona!”. E como só posso fazer uma, e como bom português, quero fazer menos de três horas…
Depois de 946 km de intensos treinos durante longas doze semanas (9 treinos longos, 300 minutos de Fartlek, pouca pista; 4 séries de 2000 – 7.47,727,731 e 7.10 – 1 teste na meia de V.F. de Xira, 1h21m30s. 66 a 68kg de peso (hoje peso 74kg), T.A. 120/60), participo na 3ª Maratona de Lisboa a 6 de Novembro de 1988!

LA COGIDA Y LA MUERTE


Sentindo-me em falta, mas porque a criatividade anda muito por baixo, valho-me da genial criatividade de outros.
E, como nestes últimos dias o "sabor" do "chá" me tem sido amargo, malgrado os esforços dos meus ilustres colegas, deixo-vos com um clássico do Lorca :




LA COGIDA Y LA MUERTE

A las cinco de la tarde.
Eran las cinco en punto de la tarde.
Un niño trajo la blanca sábana
a las cinco de la tarde.
Una espuerta de cal ya prevenida
a las cinco de la tarde.
Lo demás era muerte y sólo muerte
a las cinco de la tarde.
El viento se llevó los algodones
a las cinco de la tarde.
Y el óxido sembró cristal y níquel
a las cinco de la tarde.
Ya luchan la paloma y el leopardo
a las cinco de la tarde.
Y un muslo con un asta desolada
a las cinco de la tarde.
Comenzaron los sones de bordón
a las cinco de la tarde.
Las campanas de arsénico y el humo
a las cinco de la tarde.
En las esquinas grupos de silencio
a las cinco de la tarde.
Y el toro solo corazón arriba!
a las cinco de la tarde.
Cuando el sudor de nieve fue llegando
a las cinco de la tarde cuando la plaza se cubrió de yodo
a las cinco de la tarde,
la muerte puso huevos en la herida
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
A las cinco en Punto de la tarde.
Un ataúd con ruedas es la cama
a las cinco de la tarde.
Huesos y flautas suenan en su oído
a las cinco de la tarde.
El toro ya mugía por su frente
a las cinco de la tarde.
El cuarto se irisaba de agonía
a las cinco de la tarde.
A lo lejos ya viene la gangrena
a las cinco de la tarde.
Trompa de lirio por las verdes ingles
a las cinco de la tarde.
Las heridas quemaban como soles
a las cinco de la tarde,
y el gentío rompía las ventanas
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
¡Ay, qué terribles cinco de la tarde!
¡Eran las cinco en todos los relojes!
¡Eran las cinco en sombra de la tarde!

Federico Garcia Lorca 1935


Fernando Andrade

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

DESPORTO, LAZER E TURISMO…

Continuação...

Ainda assim não me posso queixar. Apesar de não ser um quadro superior, bem pelo contrário, sou operário da construção civil, ando nisto há trinta e tal anos e, com mais ou menos dificuldades tenho-me mantido por cá.

Recordo-me de ter passado por duas situações de ordenados em atraso – finais dos anos 70, princípios dos anos 80. Receber ao dia 37, 38 ou 45, era muito doloroso! Se fosse hoje, jamais poderia participar em tantas provas. Naquele tempo havia mais espírito colectivo, havia mais solidariedade, havia mais voluntariado. Não havia provas com inscrições pagas, e em Lisboa e arredores havia muitas provas.

Infelizmente em Portugal não havia sapatos de corrida de alta qualidade que custassem um terço do ordenado mínimo como há hoje (se havia eu nunca soube. Também não valia a pena saber, não tinha dinheiro para os comprar!). Mas para aquela altura ainda bem, pois assim não tínhamos a tentação dos comprar e com qualquer cem escudos compravam-se um par de sapatilhas – provavelmente as consequências disso estão hoje a emergir (dores na coluna).

Felizmente o país cresceu, evoluiu socialmente e economicamente, todavia como tudo na vida, há altos e baixos, nesta altura estamos a entrar – ou já entrámos – numa fase má, e esta época, face à crise económica ou financeira, não poderei participar em tantas provas (30) como na época passada.
Para participar nestas 30 provas, percorri de carro 5185 km de norte a sul do país. Visitei 23 localidades de 22 concelhos, 6 distritos e uma região autónoma (Açores, 2 vezes). Gastei 777.75 € com a viatura e…2155.90€ no total!!!

Fiz 689 km de treino (muito pouco), 364 km de competição, 27h27m45s à média de 4m41s, uma taça, algumas medalhas, muitos brindes, lembranças regionais e… as inevitáveis camisolas (32)!!!

A bem da justiça, há que referir que os custos das inscrições foram suportados pelo AFIS/OVAR, clube que represento há dois anos e representarei até à Meia Maratona da Nazaré.

Um Abraço e até à próxima.

Orlando Duarte

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

HOJE SOU EU



- Bebe este cházinho querido que te faz bem à tosse.
- Oh Mãe, mas esse sabe outra vez a literatura antiga.
- Bebe! A semana passada dei-te o chá de “Os Maias” do Eça, diz lá que não gostaste?!
- Pois… Já não bebia esse chá desde o liceu. Soube-me muito bem e recordei todos os bons momentos com a chávena na mão deste autor. Mas o ano passado disseste-me para beber o “Memorial do Convento” e eu nem com muito açúcar consegui engoli-lo. Não que não goste de Saramago, mas prefiro as suas outras bebidas. Aquela sangria do “iberismo” é mesmo a minha preferida. Se bebo muito até fico tonto, além disso, crédulo.
Tusso.
- Estás ver?! Eu não te disse que te andas tratar mal! Só folhetos distribuidos à porta do metro; de supermercados a anunciar promoções de 100%; de feiticeiros africanos que fazem ganhar o euromilhões; de próteses dentárias em que implantam duplos dentes caninos para "te tornares uma fera"; de cursos de formação como o “ torne-se em 35 horas mestre de sushi e de feijoada à brasileira, aprendendo também a encher galheteiros”; jornais de tiragem gratuita como o " Iscasse" publicado depois do fim do "idasse" e após a proibição do "fosgasse" ( sse primeiro era com c de cedilha) , o desportivo dos teus colegas de trabalho e depois dá nisto, adoeces!
- Mãe, sabes bem que tenho andado cansado. Depois as viagens nos transportes públicos o ruído perturbador da cidade que impede a concertação para beber um bom chá, o trabalho…
- As mulheres…
- Mãe! Sabem a café com cheiro a despudores tropicais que mantêm os sentidos despertos. Além disso fazem bem ao coração.
- O café provoca insónias e hipertensão! Outras pior que isso, são cicutas, não a panaceia que julgas beber.
- Bem… mas para quem gosta de signos o prazer está em viver entre o Amor e a Morte, tu sabes isso!
- Lá estás tu a ser prosaico e a querer dizer-me que além de café, também bebes whisky. Mau...
- O que é que esperavas depois de me obrigares a beber chá desde pequeno? Bem, e para que saibas só comecei a beber café aos 16 anos, até lá foi só cevada.
- A culpa foi do teu Pai que me impediu nessa altura de te dar os sermões do Padre António Vieira” ou mesmo S. Agostinho e em vez disso te serviu Baudelaire.
- Bons tempos em que bebia tudo sem açúcar e em quantidade.
- Em excesso, dizes tu!
- O excesso faz parte da arte de viver!
- Ai, ai.
A Mãe com um gesto terno, estendeu-lhe outra vez o livro.
- Vá, bebe o "Amor de Perdição". Estou a ficar uma velha tonta ao servir-te isto.
- Obrigado Mãe! Sabes que eu adoro sempre os teus chás.
E começou a sorvê-lo devagarinho…

PS - "lunático" (
sujeito à influência da Lua;
maníaco;
excêntrico. :-)

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O PAGAMENTO E O PREÇO DAS INSCRIÇÕES…

Uma das 1ªs medalhas que ganhei e que é a minha predilecta

Antes do 25 de Abril de 1974 não havia cultura desportiva de massas, aliás naquele altura havia quem tratasse mal os poucos atletas que corriam pelas ruas da cidade e, incitando-os a irem trabalhar para as obras!
O movimento de massas veio depois, e foi, sobretudo, o poder local quem apoiou o Movimento da Corrida para Todos com os apoios logísticos e financeiros.

Claro que nesse tempo os prémios eram modestos; medalhas para os dez primeiros de cada escalão e pouco mais. Os atletas eram totalmente amadores e exclusivos de clubes onde alguns recebiam pequenos subsídios.

Em 1975 a um ano dos jogos Olímpicos de Montreal, Canadá, o Prof. Moniz Pereira solicita ao governo um maior apoio para os melhores e potenciais candidatos a participarem nos Jogos Olímpicos, os atletas começam a ser dispensados nos seus empregos de uma parte do dia (manhã ou tarde). Recordo que Carlos Lopes ganhou uma medalha de prata nos 10.000 mts, Aniceto Simões bateu o recorde nacional dos 5.000 mts. Com 13.21”, José Carvalho para além de baixar o mítico crono de 50” bateu o recorde nacional com 49.9” e foi 5º na final de 400 metros barreiras!

A partir daqui e sobretudo nos anos 80, inicia-se o movimento profissional e, naturalmente, os prémios alteram-se significativamente. Tudo evolui, umas coisas bem, outras mal, até aos dias de hoje.

O que está em regressão, parece-me, é a participação dos atletas de pelotão – não podemos avaliar o movimento através das Minis das Pontes 25 de Abril e Vasco da Gama, porque aí, a participação dos 30 ou 35 mil pessoas é pontual e embora haja já indícios dum movimento de transição destas para as corridas, os valores ainda são residuais.

Segundo estudos efectuados recentemente, o atleta de pelotão, em geral, já só participa em 10/12 provas por ano contra as 20/25 de outrora. Quanto a mim, por razões de ordem económica ou financeira, entre os quais está os altos custos de deslocação, mas também os altos preços das inscrições que dispararam ultimamente. Pessoalmente vou ter que reduzir, ainda assim vou fazendo as tais 25 provas, mas na época em curso, há-de ser difícil...

Há que reflectir sobre estes números, se dantes havia imensas provas com inscrições gratuitas e com bons apoios das autarquias, hoje isso não acontece, daí a razão principal das inscrições pagas.

A sensação que eu tenho é que o Estado se está a demitir das suas obrigações. Segundo a nossa constituição no seu artigo 79, cabe ao estado promover e apoiar as instituições e as colectividades para o desenvolvimento do desporto em geral e do atletismo em particular. Se a nível de Elites os apoios já estão ao melhor nível europeu. Do ponto de vista do desporto de lazer os apoios começam a ser confrangedores! E como se pode ver, o que o estado poupa ao não apoiar e não promover o desporto de manutenção e lazer, vai mais tarde pagar em despesas de saúde, com a recuperação de jovens “apanhados” pela toxicodependência, e a baixa produção dos adultos activos, graças às elevadas taxas de abstenção no trabalho por via de altos índices glicéreos, ou colesteróis, ou cardíacos!

Conclusão: como tudo hoje é pago, ou tendencialmente pago, (quem quer saúde paga, quem quer habitação paga, quem quer cultura paga etc. etc.) porque não pagar as inscrições das corridas?

Perante o quadro actual, claro que estou de acordo! O que não estou de acordo é com o valor, muitas vezes, exorbitante. Depois há aquela estratégia da inscrição barata a seis meses do evento e que sobe vertiginosamente a um mês da corrida. E há os casos do oito ou oitenta. Veja-se o caso da Corrida do Tejo; teve inscrições gratuitas durante as primeiras 24 edições, de repente passa para 7€, depois 8€, já vai em 10€! Já para não falar dos preços exorbitantes das “meias” das pontes! Aqui ao lado na vizinha Espanha, onde o poder de compra é substancialmente mais elevado que o nosso, os preços são semelhantes e nalguns casos inferiores, veja-se o caso da excelente Meia Maratona de Sevilha com 7€ de inscrição!!! Das duas uma: ou os “nossos” organizadores são, um pouco, gulosos, ou os espanhóis têm muito mais apoios! Ou será as duas coisas?...

Continua…
Um Abraço
Orlando Duarte

domingo, 26 de outubro de 2008

3º GRANDE PRÉMIO JOSÉ ARAÚJO

Sem dúvida que foi uma bela manhã de corridas. A minha crónica deste ano, felizmente, vai ser diferente da do ano passado. Diferente porque, tal como eu desejei, não houve acidentes, ao contrário do ano passado, nem sequer incidentes (apesar dum pequeno lapso na corrida dos infantis que ficou mais curta, mas felizmente foi para todos, o que levou a não haver prejuízo para ninguém.).

Estou feliz porque José Araújo foi mais uma vez homenageado com a presença de mais de sete centenas de atletas de ambos os sexos e todos escalões e, sobretudo, porque tivemos a sua presença, da sua esposa e da sua escola de atletismo, pese embora os seus 84 anos!


José Araújo continua ligado à modalidade pelo segmento da formação e captação de jovens. E se os seus mais de 70 anos ligado às corridas não bastassem, o facto de não largar esta tarefa, mais a sua dedicação, seriam merecedores desta singela, mas sentida, homenagem que a Junta de Freguesia de Campolide lhe vem prestando ao longo destes últimos três anos.


Estou também satisfeito com os números (neste momento só tenho os da prova de 10km) de participantes desta edição. Houve um aumento de 102 chegados (+28.02%) que o ano passado. Passámos de 364 para 466, não obstante o limite de 400 inscrições. Nos últimos dias válidos para a inscrição, os pedidos foram tantos que houve necessidade de condescendência, o que levou as inscrições até ao máximo de 520!

Há atletas que questionam o porquê deste limite. A razão que leva a este procedimento tem a ver, fundamentalmente, com dois aspectos:
1 - O limite de capacidade, logística e humana, duma autarquia que não nada em dinheiro nem em recursos humanos, e apesar do empenho, generosidade e acção do movimento associativo na freguesia, que tudo tem feito para nos apoiar, há que reconhecer que o tempo dos “carolas” e voluntarismo já não é o que era!

2 - O receio de pormos em causa a segurança e integridade física dos atletas, à entrada e saída, e até durante o percurso na galeria do aqueduto, porque não, e por via disso a prova vir a perder qualidade. Nós queremos continuar a ver os semblantes dos atletas à chegada, com expressões algo pesadas face ao exigente troço entre os kms 4.5 e 6.5, mas todos, ou quase, com um sorriso nos lábios e a dizer mais ou menos isto: “vale a pena fazermos aquelas subidas, a panorâmica cá de cima é maravilhosa!” “ Que espectáculo! É pena ser só um quilómetro em cima do aqueduto!”



Um Abraço e até à próxima!


Orlando Duarte

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

REBOBINAR PARA RESPIRAR



Nha corpo é di tchom
Nha’alma é di Deus
Vida é di meu
Coraçon é pa bô

 

Um porto de abrigo. Deixa-me lançar amarras no teu corpo. Estou cansado da tempestade dos dias.

 

 Ontem terça-feira de um plano de treinos em défice.

 

Serei breve nesta minha descrição do treino de ontem:

São 16.30, visto o equipamento para correr: collants quentinhos comprados nestes hipermercados que vendem os produtos da globalização há muito anunciada; camisola térmica regateada nos picos da Europa a um português que vendia produtos fabricados em Portugal mas com a marca de uma multinacional  e ténis de treino “made in…”, não precisam de se dar muito ao trabalho de adivinhar, já estão a ver não é?! Saio para a rua, reparo que sou alvo de atenção da população sedentária do café perto da minha casa. Nada a que não esteja habituado, as meninas devem achar que eu estou com uma lingerie sexy e os meninos que sou alguma borboleta esvoaçante a caminho de uma gay parade. Do pensamento das primeiras, sinto-me lisonjeado, dos segundos: enganam-se  rapaziada  vou correr! E corro, neste dia de Inverno fresco com uma ligeira neblina que assenta num dos muitos braços com que o Tejo aqui rasga a terra na sua ânsia de grandeza e liberdade. 1.23m de um treino “raivoso”, a penitenciar-me dos pecados da gula do fim-de-semana passado. Quando acabo, sinto que o meu corpo expurgou contrariado pelos poros o que o saciou dias antes. Até estou zonzo. Retorno à calma, alongamentos, hidratação ( H2O). Consulta da “escala de serviço” ,estou outra vez escalado para fazer o jantar…hidratos de carbono e proteínas de frango (  e quem sabe uns nitrofuranos) e a acompanhar uma bebida quente com vitaminas e minerais…gostam?!

Hoje 70m “on the rocks”

 

Abraço e bons treinos.

 

 PS - Desculpem, mas este estava na gaveta. Contudo posso decalcá-lo ao dia que agora termina. Para a semana ( ou ainda esta há mais).

 

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

TERRA


Pousou a chávena de chá cuidadosamente sobre a mesa, endireitou-se no sofá e proferiu, num tom vago, indefinido, esta verdade, que de tão verdadeira até dói: “As coisas vulgares que há na vida não deixam saudade.” O seu olhar atravessava cada um de nós sem nos ver, mergulhado que estava num ponto preciso, que sabíamos fantástico, surreal. Suspensos daquela frase, aguardámos em silêncio um desenvolvimento que tardava. Mas quando chegou, foi como que uma torrente de emoção e delírio se derramasse sobre nós, copiosa e incontinente.

Falou de si, falou de nós. Ora com a enorme força da sua portentosa voz, ora num sussurro quase inaudível. Mais do que ouvir, podíamos sentir a sua respiração. Então, como sempre fazia, apresentou-se, abriu-nos o seu coração e cantou. E assim cantando, tudo e todos encantou. “Há dias que marcam a alma e a vida da gente”, dizia. “Vende sonho e marezia”, acrescentava. E era como se todos fossemos tomados de verdadeiro arrebatamento e bebêssemos nas suas palavras o sentido duma vida que, não poucas vezes, se nos apresenta sem sentido.

Saltitando entre Pessoa, Camões ou Florbela Espanca, seguia “do vale à montanha, da montanha ao monte”. Sentia-se, vivia-se, sonhava-se, enquanto confessava: “Eu canto um país sem fim”. Descia às tascas da Mouraria, mergulhava na sua infância, dava um salto a Cabo Verde. E, de lugar em lugar, ia subindo, até se afirmar no nosso mais íntimo como alguém que é parte integrante do todo que somos nós, do todo que é Portugal, que é a sua língua, que são as suas gentes.

“Ó gente da minha terra!” Arrepiante, a sua voz era agora uma faca que penetrava nos corações e nos turvava a vista de lágrimas. Passeava-se ali à nossa frente, homens e mulheres beijando-lhe as mãos, derramando “emoções que dão vida à saudade que trago”. Quando fez menção de se ir embora, ninguém lho permitiu. A conversa prolongou-se com trivialidades e muito humor. Falou de ter ido “à Feira de Castro” ou de como se travou de razões com o “senhor vinho”. Ainda teve tempo para nos ensinar a cantar em “inglês”. Mas depois, inevitavelmente, tudo acabou.

Levantou-se e vimos como era alta. Muito alta e esguia. Ao sair voltou-se para trás, adivinhou-nos a interrogação e respondeu, ainda e sempre com um sorriso: “Nem às paredes confesso!” À medida que se afastava, um turbilhão de ideias tomava conta dos espíritos e uma certeza impunha-se às demais: “Há gente que fica na história da história da gente”. Obrigado Mariza!

JOAQUIM MARGARIDO

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segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Ainda o Tejo




Diz ele: "- A prova roça a perfeição!"
Diz ela :"- Então esclareça, por favor,
Se com tão alta taxa de inscrição
Pode essa prova ser de tal primor!?
Leva o coiro e cabelo até mais não
E em troca… uma t-shirt "anti-suor"
De uma só cor, de forte intensidade,
Passando a multidão a irmandade.

Na minha terra isto é publicidade
(Que aqui, parece bem eficiente),
Dez mil assim, em uniformidade
Num monocolorido mar de gente;
Era justa menor austeridade
C'um preço mais em conta, simplesmente,
Que exibir neste evento a marca xis
Vale talvez bem mais do que se diz! "
Fernando Andrade

PORQUE COMECEI A CORRER...


Porque comecei a correr?

A Minha modalidade favorita era o ciclismo, por via da grande festa da Volta a Portugal. Vivia num bairro pobre da periferia da cidade de Lisboa. Como não tínhamos bicicletas, arranjávamos caricas, colocávamos no seu interior cascas de fruta, para podermos distinguir qual era a nossa "bicicleta", desenhávamos uma pista no chão, com curvas, subidas, descidas, pontes etc. etc. e ali estávamos horas e horas naquelas corridas…as corridas, propriamente ditas, entravam nos jogos do Lenço, na apanhada e pouco mais.

Até que um dia…alguém acendeu a luz a este país. O país abriu-se, ficou mais alegre, mais humano e começou a desenvolver-se. Apareceu um movimento que tinha como lema: "O Desporto Para Todos" ou o "Desporto à Porta de Casa", não fui insensível e fui "contaminado". Com dois ou três amigos comecei a treinar (a esta distância reconheço que comecei muito mal), as provas foram aparecendo e desde o princípio de 1975 que pratico a corrida.

Qual a primeira corrida?

Sinceramente não me lembro. Certamente, até hoje, terei participado em mais de 600 corridas. Todavia, só dez anos mais tarde comecei a registar as corridas em que participo, por via disso, posso afirmar que desde Setembro de 1985 até 19 de Outubro de 2008, participei em 441 corridas, tendo percorrido 4 896 quilómetros em competição e recebido imensas lembranças, entre as quais 326 camisolas!

O que me custou mais?

O início foi algo penoso, por ignorância, por falta de apoio material, pela qualidade do material…os mais velhos perceberão o que eu estou a relatar. Os mais novos se, por ventura, virem fotografias de há 30/35 anos, facilmente perceberão o que eu estou a tentar dizer-lhes. Os tecidos, secos já eram pesados, imaginem depois de suados…os sapatos de corrida idem idem. Pertencer a um clube pobre de bairro, que apesar de ter algumas pessoas empenhadas e generosas, pouco mais nos podia dar. O país estava atravessar uma crise política e, por consequência, económica. E assim, só a força da juventude, a paixão que a pouco e pouco se apodera de nós, os resultados que vão melhorando prova após prova, superou todos esses obstáculos e me fez "resistir" até hoje (e espero por muitos mais anos).
Hoje tudo é diferente, há mais e melhores condições de treino, há mais conhecimentos, e se houver calma e paciência, a introdução na corrida poderá ser indolor. Começar com uma hora de corrida contínua, como eu comecei, hoje é impensável. Há que alternar: corrida ligeira com marcha, retirando pouco a pouco a marcha chegando ao ponto de se fazer a tal hora de corrida contínua com prazer…


Meu maior sonho?

Tive vários. O primeiro foi entrar para um grande clube. Em Setembro de 1976 fui prestar provas ao Estádio do Restelo a fim de entrar para o C. F. "Os Belenenses" e fui aprovado. Convém recordar que naquela época aquele clube atravessava um mau bocado e os subsídios para os atletas eram fracos, logo o quadro de atletas não podia ser muito forte, daí o meu recrutamento. Porém, três meses depois surgiam-me problemas nos joelhos e foi detectado um problema congénito nas rótulas e tive que ser operado aos joelhos e lá se foi o meu primeiro sonho…

Dez anos depois, comecei a sonhar com a maratona. Face à retirada de dez por cento das minhas rótulas, a intensidade de treino, necessariamente, abrandou e a maratona era mesmo um sonho. Contudo, pensei: “com mais ou menos dores, tenho que fazer uma maratona!”. E como só posso fazer uma, e como bom português, quero fazer menos de três horas… depois de 1000 km de intensos treinos durante longos três meses, participo na Maratona de Lisboa a 6 de Novembro de 1988. As condições climatéricas não podiam estar piores para se fazer uma maratona: frio, chuva e sobretudo vento. Durante a corrida vejo o tempo a passar e nenhuma marca de passagem a ser cumprida, a dada altura, num dos poucos locais que havia vento a favor, ainda me aproximei do objectivo porém, aquela légua dos 30/35 km na 24 de Julho com vento forte contra, deitou tudo a perder. Eu estava a valer 2h55, mas o objectivo era baixar as 3 horas, nem que fosse 2h59m59…naquelas condições saiu 3h02m10s e lá se foi mais um sonho…mas o prazer de completar uma maratona ficou cá, é inesquecível, inenarrável, só quem já transpôs aquela linha final compreende o que estou a dizer...

Próximo sonho: correr até aos últimos dias da minha vida…

A partir de hoje, sem nunca ter sonhado ser jornalista (que não sou, nem pouco mais ou menos), muito menos escritor, acho estar a viver um sonho… poder colaborar com este blogue rodeado de cinco excelentes escribas!!!

Um Abraço e até um dia destes por aí nalguma prova!

Orlando Duarte

domingo, 19 de outubro de 2008

28ª CORRIDA DO TEJO

Esta prova está atingir padrões de alta qualidade e a roçar a perfeição. É muito difícil encontrar pontos negativos (há provas que os pontos negativos são tão gritantes que não é preciso procurá-los).

Felizmente a Corrida do Tejo sempre foi uma corrida bem organizada e inovadora. Há três anos com a comercialização da prova, temos que reconhecer que as mais-valias são evidentes. Ainda assim, sem procurar muito há, pelo menos, duas situações que terão que melhorar:

1º - O transporte ferroviário antes da corrida (é inadmissível aquelas condições de transporte, já não considerando o prejuízo causado a cidadãos alheios à corrida, que ficaram inibidos daquele transporte);

2º - A escassez de retretes portáteis – junto às portas principais haviam só quatro – geram imensas filas de espera por um lado e por outro “obrigam” os homens a fazer aquela figura canina junto às paredes, mas até aqui tudo bem (?), o pior é o caso das mulheres, como é? Andamos sempre a dizer que há pouca participação feminina (o que não foi o caso, hoje tiveram em prova 1905 mulheres 21.25% dos participantes), que as mulheres não saem de casa, que não participam, mas depois não lhes damos as devidas condições. Na pastelaria onde tomei café, era vê-las aflitas, do ponto de vista fisiológico e cronológico, meia hora na fila, naquelas condições não é fácil!

O preço das inscrições será certamente para muitos, um ponto negativo. Mas aqui, há o benefício do retorno com a qualidade da organização. Enquanto nos pontos referidos todos, dum modo geral, são atingidos, no caso do preço das inscrições atinge os menos abonados – e nesta altura 10€ (ou 14€) fará diferença no orçamento familiar de muita gente.

CURIOSIDADES

8961 Atletas classificados

7056 Homens / 78.75 %

1905 Mulheres / 21.25 %

Nos primeiros 1 000 classificados chegaram 31 mulheres / 3.1 %

Nos primeiros 2 000 classificados chegaram 80 / 49 mulheres / 4 % / 4.9 %

Nos primeiros 3 000 classificados chegaram 157 / 77 mulheres / 5.23 % / 7.7 %

Nos primeiros 4 000 classificados chegaram 251 / 94 mulheres / 6.27 % / 9.4 %

Nos primeiros 5 000 classificados chegaram 383 / 132 mulheres / 7.66 % / 13.2 %

Nos primeiros 6 000 classificados chegaram 581 / 198 mulheres / 9.68 % / 19.8 %

Nos primeiros 7 000 classificados chegaram 843 / 262 mulheres / 12.04 % / 26.2 %

Nos primeiros 8 000 classificados chegaram 1254 / 411 mulheres / 15.67 % / 41.1 %

Nos últimos 961 classificados chegaram 651 mulheres / 67.74 %

Um Abraço e até à próxima!

Orlando Duarte

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A Folha

Segurou-se com as derradeiras forças ao ramo que a mantinha suspensa, mas inevitavelmente uma leve brisa outonal foi suficiente para a arrancar e levar pelo ar.

Esta manhã tinha acordado com o sobressalto da consciência súbita que cada segundo passado significava menos tempo para ela chegar. Ela, essa personagem esperada, mas sempre surpresa. A Morte. Cada segundo passado significa menos tempo para ela chegar, nesse dia que será o dia da morte dela, o seu dia que chegará um dia. Porque as folhas também morrem, como as pessoas. Sacodem-nas o vento num dia de sua velhice, até as arrancar do ramo a que se agarram e que as alimenta, se antes mãos humanas ou desumanas as não arrancaram já do ramo, ainda vivas e verdes e jovens, espirrando seiva como sangue e lágrimas, que escorre viva pela mão impune assassina.

E esvoaça pelo ar a folha, cruza-se com corvos e pardais, pousa num telhado por segundos de meditação para logo de seguida ser atirada ao chão, pisada e com sorte juntar-se às irmãs, formando húmus que alimentará árvores como a sua mãe, que de novo darão mais folhas, verdes, como ela já foi e em conjunto serão de novo árvore. O ciclo repetir-se-á enquanto distraídos passam os homens pela vida e pelas árvores.

Mas esta folha teve outra sorte. Foi parar a outras mãos. Umas mãos de dedos esguios delgados, que buscavam ervas para um chá. Ervas, folhas e plantas. Variadas. Para um chá especial. De aliança entre os homens. Requintado e convidativo queria-se o chá. Seleccionava ervas ele, de entre todas excluindo as daninhas que não deixam crescer as outras e dão um sabor amargo ao chá, contando-se até que o torna venenoso, algumas.

Cuidadosamente, ele pegou na folha. Naquela folha. Tinha uma forma estranha, e apesar de morta, havia nela ainda vida, vida para se transmitir, para passar a outras folhas, a árvores, a homens e a mulheres.

Levou-a para casa com cuidado com as mãos em concha, como que para evitar que os resquícios de vida que ele sentia nela não se escapulissem definitivamente, e protegeu-a do vento e dos pés dos homens.

Na chaleira a água já fervia. Cuidadosamente esmagou parte da folha e misturou-a com as outras trazidas pelos outros. Verteu a água fervida sobre a mistura num bule que de imediato exalou um odor único que encheu a sala e se espalhou pelo mundo num rasto com caminho e destino desconhecido.

O chá estava pronto.
ANA PEREIRA

Geografia





Entre Ovar e o Porto corre o Tejo!
Outubro assim define a “geografia”
E vai correndo em nós o são desejo
De aceitar o convite à correria.
Nem sempre ao pátrio espaço cabe o ensejo
De ter mais atenção e primazia,
Que aqui, correr é que é prioritário
Mesmo que o mapa informe do contrário.

Fernando Andrade

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Bom Chá!



MENINOS, A CHALEIRA JÁ ASSOBIA! TRAGAM AS CESTINHAS COM AS FOLHAS! Gritou a "Mãe" procurando reunir à sua volta os "meninos" que andavam meio dispersos. Lá em casa apenas tinha umas folhas já meio secas colhidas há já algum tempo, de uns virtuosos arbustos, da última vez que fora treinar para o Parque da Paz. Mas ela queria fazer um chá mais diversificado. Precisava de outras espécies, com outros aromas e esperava que cada um trouxesse das melhores folhas colhidas lá pelos lugares onde passam a maior parte do tempo.

Esperava-se que chegassem as aromáticas e raras folhas colhidas nas bermas dos “trilhos míticos” da Arrábida. Nas zonas de difícil acesso das velhas paredes do Aqueduto das Águas Livres, teriam sido cuidadosamente retiradas umas pequenas plantas, de características muito especiais; Dos Jardins de Serralves chegaria um cabaz com várias espécies exóticas de aroma discretos mas consistentes; O pão-de-ló de Ovar e umas queijadinhas de Sintra, iriam dar um acompanhamento perfeito.

No bule com água fervente, foi feita a infusão com os vários tipos de folhas conseguidas. Voltou-se a tapar, de acordo com o velho ritual e bastou aguardar alguns minutos, para que as xantinas se libertassem.

Chegaram-se todos junto à mesa. Uma mesa enorme, redonda, com uma toalha de linho, sobre a qual se distribuíam as chávenas. Ao centro havia uma velha jarra (vinda de uma outra sala, de boa memória) contendo um lindo ramo de flores.

Cada um ocupou o seu lugar e, num acto solene, a “Mãe” proferiu as seguintes palavras:

- Tomai todos e comei. Este é o chá da aliança, feito por todos nós. Que aquilo que nos une prevaleça sempre sobre o que nos divide. Longa vida ao Chá dos Cinco!

Brindaram! E ocuparam os seus lugares…

FERNANDO ANDRADE

terça-feira, 14 de outubro de 2008

O PRIMEIRO DIA


Foi com resignação, mas sobretudo com uma enorme tristeza, que recebeu a notícia. Estava assim por ela, que a sabia igualmente triste e desiludida. “A princípio é simples”, mas agora… Tinha sido o grande responsável pela sua vinda e, no momento da partida, era como se perdesse algo que lhe era muito querido.

Não deixariam de se ver, não trairiam a sua amizade, haveria sempre a garantia duma palavra do lado de lá do telefone. Mas aquele sentimento de união sob uma mesma bandeira, sob um mesmo emblema, aquele “brindar aos amores com vinho da casa”, aquela força interior que advinha do facto de partilharem gostos e vontades de chama ao peito, isso não mais se repetiria.

Alguém poderia censurá-la, acusá-la do que quer que fosse? Ninguém. Espalhara aos quatro ventos a sua enorme alegria e juventude sem esperar nada em troca. “E enfim, duma escolha, fez-se um desafio”. Convicta da justeza do seu acto, ali estava ela, afirmando que nem tinha razões para sair. Só que lhe faltavam motivos para ficar.

Resignado e triste, ele era "um rapazinho a ver se compreende”. Revoltado só de pensar que não estava certo. Desesperado por não conseguir “beber a coragem até dum copo vazio”. Impotente em contrariar esta tendência, cada vez mais feroz, do individual que abafa o colectivo. Desiludido com esta vida de merda, com este “corre-corre” onde não há tempo para ter tempo.

Então sentou-se e escreveu. E escrevendo sentiu-se melhor. Passou os olhos pelo que tinha escrito e viu que, não dizendo tudo, disse muito do que queria dizer. Já passara por isto algumas vezes e sabia que “doutra maré-cheia virá a maré-vaza”.
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Depois levantou-se e foi tomar chá.

JOAQUIM MARGARIDO

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